Nelson da Rabeca e Benedita
Cultura tradicional

Nelson da Rabeca e Benedita

Na juventude, Seu Nelson trabalhava nos canaviais do interior de Alagoas. Um dia, ao ver um músico na televisão, se encantou e resolveu aprender a tocar rabeca. Aos 52 anos descobriu que tinha um dom. A partir daí, se dividia entre o canavial e os shows na praia do Francês. Deixou a dupla jornada para fazer o que mais gosta: viver de música. Junto com a sua eterna companheira, Dona Benedita, roda o Brasil levando a alegria da música tradicional. O casal se apresentou no XIV Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros, em 2014, com show e a Oficina de Construção de Rabecas.

Do primeiro olhar ao casamento foram apenas três semanas. Hoje, eles sustentam mais de 50 anos de casamento, dez filhos e uma vida feliz nos palcos. “Foi amor à primeira vista”. Conheça a história de vida do mestre da rabeca, Seu Nelson e de sua companheira na vida e na voz, Dona Benedita.

Na cidade de Marechal Deodoro, em Alagoas, o jovem Nelson fez parte de sua vida no canavial. “Eu trabalhava pro meu pai, pra minha mãe e pro meus irmãos. Cortava cana e fazia todo o serviço, mas o meu pai não deixava eu ir pra nenhum canto nessa vida”, relembrou Seu Nelson.


Quando ele finalmente conseguiu sair de casa, encontrou a mulher que o acompanharia pelo resto da vida. “A única vez que eu me escapuli eu me encontrei mais ela”, contou seu Nelson sobre o encontro com Dona Benedita.

“Nem eu conhecia ele, nem ele me conhecia. Um dia ele passou por mim e eu tava lavando roupa. Aí ele olhou pra mim eu taquei o olho em cima dele, e pensei ‘Eita que gato bonito da peste’. Aí eu não sei o que aconteceu. Em três semanas eu namorei, noivei e fui-me embora com ele. Ele tinha 19 anos e eu tinha 16. Foi amor à primeira vista”, lembra Dona Benedita.

Seu Nelson relembra que seu pai ficou assustando quando ele chegou em casa com Dona Benedita. “Mas Nelson, tu carregaste esta menina, seu cabra sem vergonha!”. E a partir daí tiveram dez filhos e nunca mais se largaram.

A paixão pela música vêm da infância, mas foi só aos 52 anos que Nelson descobriu a sensação de tocar um instrumento. “Desde pequeno eu gostava muito de música, só não podia comprar nada. Mas eu via a pessoa tocando e achava aquilo lindo demais. Eu tinha 52 anos quando eu vi uma pessoa tocando violino na televisão dos outros. Eu não tinha nem onde morar, não tinha televisão, não tinha nada. Ai eu fui pro mato, tirei a madeira e resolvi fazer a rabeca pra ver no que dava”, brincou.

E a ideia deu certo. Nelson saiu da lavoura para ganhar o mundo com as suas duas companheiras, Dona Benedita e a Rabeca. “Eu trabalhava quatro dias no canavial e sábado e domingo eu ia pra Praia do Francês tocar pros turistas. O dinheiro que eu ganhava tocando quatro horas, eu não ganhava em um mês trabalhando no canavial. Aí eu deixei de tocar só na praia e fui tocar no mundão todinho mais ela”.


Mesmo sem estudo e já com a idade avançada, seu jeito de tocar a rabeca chamou a atenção de especialistas da música. Um deles, o violinista, rabequista e compositor José Eduardo Gramani, falecido em 1998. “Eu não estudei. Então aprendi sozinho. Mas um amigo, o Gramani, me ajudou pra eu aprender mais. De vez em quando ele ia lá pra casa e ficava um bocado de dia tocando mais eu. E o homem tocava demais”. 

Com sua voz enérgica, Dona Benedita conta que seu Nelson traz na memória um computador. “Olha, eu fiz uma música pra ele, falando que na memória dele tem um computador. Porque ele aprendeu a arte de tocar pela televisão. Outras pessoas também viram, mas não aprenderam. Ele viu e botou tudinho na memoria. É verdade, a memória dele é um computador mesmo. Se ele vê uma coisa aqui, ele grava tudo”.

Dona Benedita levantou do banquinho e começou a cantar:

“Seu Nelson da Rabeca era um agricultor
e já mostrava o seu valor.
Na memória dele tem um computador,
ele aprendeu a sua arte por um televisor.
Na memória dele tem um computador,
ele aprendeu a sua arte por um televisor”.


A vida desse simpático casal agora é fazer show. Dona Benedita na voz e Seu Nelson na rabeca. “Eu já toquei mais os rabequeiros do mundo todinho, Hermeto Pascoal, Siba, Mestre Ambrósio. Já toquei no Brasil todo e até no exterior, na Noruega”, brincou Seu Nelson.

Quando canta para o público, Dona Benedita entra em êxtase. “Meu Deus me ajude, que a maior alegria que eu tenho é quando eu tô no palco com aquele pessoal todo ali olhando pra gente. Quanto mais gente eu vejo, mais eu sinto uma alegria boa. Quando a gente sobe no palco, se esquece de tudo, só vê a música”.

OFICINA DE RABECA

Durante quatro dias do Encontro de Culturas, de 30 de julho a 2 de agosto de 2014, Seu Nelson e Dona Benedita ensinaram o passo a passo de como construir uma rabeca, instrumento rústico de origem árabe semelhante ao violino.

Trabalhando cerca de cinco horas por dia, Seu Nelson e Dona Benedita ajudaram desde a confecção do primeiro molde da rabeca até os detalhes finais. “O pessoal tem dificuldade pra cavar sem furar. Mas o pessoal daqui tem muita facilidade pra fazer as coisas. Eles são interessados, são inteligentes. É bom demais ensinar gente assim”, afirmou Dona Benedita.   

2020

No XX Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros, Nelson da Rabeca e Dona Benedita se apresentam no dia 13 de agosto de 2020, junto a Maciel Salú e Tomas Rohrer, em um encontro especial!

   

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